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segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

Quando o amor devora


Por Roberta de Medeiros

Há três anos, a técnica em prótese dentária, Kelly, 33 anos, encontrou um namorado de quem tenta se separar. O problema era que o alvo do seu amor a agredia física e verbalmente, além de abusar drogas e álcool. Sempre que o parceiro se distanciava para tocar em barzinhos sozinho, ela ficava com insônia. Por causa da tensão vivida por um amor conturbado, ela teve uma perda brusca de peso, ficava constantemente irritada e apresentava tensão muscular. No passado, Kelly conta ter sido controladora e ciumenta com outros homens, um tipo de postura que provoca brigas entre o casal. Sempre que se comporta assim, ela é agredida por seu namorado.

Esse é um caso de amor patológico. A pessoa embarca numa união simbiótica na tentativa de fugir da insuportável sensação de abandono. Ela dirige toda a sua atenção à pessoa amada, desdobrando-se em cuidados e gentilezas que nunca cessam porque ela simplesmente não sabe como controlar o impulso de agradar o parceiro. Numa postura obcecada, aquele que vive esse amor não consegue mudar de foco: seu objeto de desejo torna-se uma prioridade, enquanto os outros interesses ficam em segundo plano. 

Esse amor é vivido por pessoas de personalidade vulnerável, marcada pela baixa auto-estima e pelos sentimentos de rejeição e raiva. São pessoas que cresceram em famílias desajustadas, com pouca atenção e carinho dos pais. Por isso, tentam compensar esses anos de ausência com um amor possessivo. Elas acabam reproduzindo desarranjos do passado, escolhendo parceiros dependentes, e que logo irão se mostrar negligentes, inacessíveis e problemáticos. 

“A pessoa tem dificuldade de estabelecer limites entre ele e o parceiro, manifestada pela atitude constante de manter o outro sobre controle e uma busca incessante pela fusão com o parceiro. Os critérios diagnósticos para o amor patológico são semelhantes à dependência química”, diz a psicóloga Eglacy Cristina Sophia, pesquisadora e psicoterapeuta do Pro-AMITI (Ambulatório dos Múltiplos Transtornos do Impulso) do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da USP, que traçou o perfil das pessoas que sofrem de amor patológico em sua dissertação de mestrado, defendida em 2008.

Alguns pesquisadores acreditam que o amor patológico surge de acordo com o vínculo que a pessoa vivencia com mãe durante os primeiros anos de vida. Esse tipo de amor ocorreria quando a pessoa experimenta, na infância, uma relação insegura com a mãe, sofrendo a ansiedade de separação – um tipo de vínculo que os especialistas chamam de “ansioso ambivalente”. A atenção e proteção da mãe oscila: ela está presente para apoiar a criança em algumas situações, mas em outras não, criando ameaças de abandono usadas por ela como meio de controlar a criança.  Na fase adulta, ela agirá como se nunca soubesse se a pessoa amada fosse estar presente ou ausente. Ela verá as outras pessoas como mais importantes e sentirá medo da perda, por isso, precisarão ser mais vigilantes com seus parceiros.

Tudo indica que a disponibilidade emocional da mãe em situações estressantes, principalmente separações, é o meio pelo qual a criança aprende a perceber e a se relacionar com o mundo, além de estar ligada a fatores genéticos dela própria. “No primeiro ano de vida, a criança desenvolveria uma ‘lente’ a partir da qual a pessoa vai ver o mundo e a si própria, ou seja, um tipo de vínculo específico e que se transformaria numa maneira de se relacionar na vida adulta”, diz Eglacy.

Essa teoria foi chamada de teoria do apego. O primeiro de mais importante teste da teoria do apego foi publicado psiquiatra inglês John Bowlby, com a colaboradora Mary Ainsworth, em 1978, quando surgiu o primeiro sistema de classificação: o seguro, o rejeitador (ou ansioso com evitação) e o ansioso/ambivalente (ansioso resistente).

Box – Tipos de apego
No apego seguro, a mãe é sensível às necessidades da criança e promove confiança de que os pais estarão disponíveis, caso ela se depare com uma situação amedrontadora. A pessoa, então, se sente corajosa para explorar o mundo, estando apta a vivenciar o amor saudável durante a vida adulta.

No apego rejeitador, há constante rejeição por parte da mãe quando a mãe procurava obter proteção, gerando falta de confiança de que terá ajuda quando precisar. A pessoa passa a tentar viver sem amor e sem ajuda dos outros, ou seja, tornar-se emocionalmente auto-suficiente.

Para a pessoa com apego ansioso-ambivalente, os pais estiveram disponíveis em algumas situações e não em outras, levando o bebê a vivências de separação e ameaças de abandono, usadas pelo pai como meio de controle. Isso gera incerteza quanto à disponibilidade dos pais e, consequentemente, à ansiedade de separação no relacionamento adulto.

Fonte: Eglacy Cristina Sophia


Personalidade
"Nossa experiência clínica tem mostrado que a pessoa com amor patológico presta cuidados ao parceiro, mas com o intuito de obter afeto, sem respeitar as necessidades e interesses do outro, muitas vezes com atitude crítica quando não recebe o esperado, contrariamente ao conceito de cooperatividade que inclui ajuda desinteressada, tolerância e empatia social", diz Eglacy.

O seu estudo mostrou que pessoas que sofrem de amor patológico também têm dificuldade de estipular metas e de se manter focado nelas. “Isso ocorre porque o foco principal de suas vidas é manter o parceiro sob controle, porque necessita da sua atenção”, diz Eglacy. As principais estratégias utilizadas para controle são ligações telefônicas, seguir o parceiro, interrogar sobre as atividades dele, ser extremamente atencioso para com as necessidades dele e provocar ciúme. 

-Dependência
Há quem diga que o medo é a essência desse amor. A pessoa foge da sensação de isolamento tornando-se parte de outra. Alguns estudos mostram que as reações químicas observadas no cérebro daqueles que vivenciam o amor patológico seriam muito parecidas àquelas encontradas em pessoas que sofrem de transtorno obsessivo-compulsivo ou TOC, uma alteração de comportamento que faz com que a pessoa tenha pensamentos persistentes de medo e ansiedade. Para aliviar o mal-estar, ela costuma realizar tarefas ou gestos repetitivos, como se desdobrar em cuidados dirigidos à pessoa amada.   

A maioria dos pesquisadores, no entanto, defende que o amor patológico se assemelha à dependência por drogas ou álcool. A pessoa experimenta uma sensação de abstinência quando está longe da pessoa amada, gasta muito tempo e energia em cuidados, abandona atividades para cultivar esse amor, seu cuidado exagerado traz problemas para pessoa.  

“Embora alguns autores comparem os sintomas do amor patológico aos pensamentos repetitivos do TOC, nossos estudos têm demonstrado que as pessoas com amor patológico apresentam critérios semelhantes à dependência, como cuidar do parceiro mais do que gostaria, tentativas de diminuir esse comportamento são insatisfatórias e sinais e sintomas de abstinência quando há ameaça de abandono”, explica Eglacy. Ela lembra que a alta impulsividade encontrada no amor patológico se assemelha aos demais transtornos do impulso, como jogo patológico por exemplo.

-Descargas
Segundo Eglacy, o estado de exaltação desse amor provocaria fortes descargas de adrenalina, o que pode explicar o estado de constante euforia. As sensações experimentadas por quem experimenta esse tipo de amor são semelhantes à provocada por altas doses de anfetamina. Isso acontece porque o amor produz sua própria substância, a feniltilamina. Ela também estaria presente no chocolate, o que explica porque algumas pessoas que vivem uma perda gostam de se empanturrar de chocolate.

Um estudo verificou que, independente da cultura, a reação do cérebro dos apaixonados é a mesma: ao ver fotos do ser amado, se "acendem" algumas partes do núcleo caudado do cérebro, estrutura que regula a sensação de recompensa. São zonas ricas em dopamina, neurotransmissor que age no cérebro promovendo sensação de motivação e prazer, e endorfina, que desperta sensação de bem-estar e euforia . “O fenômeno é semelhante ao que ocorre com dependentes químicos e jogadores patológicos diante da droga de escolha, por exemplo.”, exemplifica a psicóloga.

Mas quem sofre mais de amor patológico? Foram identificadas divergências em várias culturas: na população americana, as mulheres com essas características superaram os homens, e entre os japoneses e russos, as atitudes de amor patológico prevaleceram no sexo masculino.

O problema é que as pessoas que vivem o amor patológico só buscam o ajuda profissional quando perdem o parceiro. E quando isso acontece, elas têm mente mudar de algo em seu comportamento com a esperança de agradar o parceiro na esperança de assim ele irá voltar. Nesse sentido, os programas de recuperação como o DASA (Dependentes de Amor e Sexo Anônimos) e o MADA (Mulheres que Amam Demais Anônimos) podem ajudar superar o problema.

-Transtornos psiquiátricos
Segundo a pesquisa realizada por Eglacy, 22% das pessoas com amor patológico não têm qualquer transtorno psiquiátrico, o que mostra que esse quadro pode surgir isoladamente. Outro achado é que o alto risco de suicídio identificado em 28% deles (o que mostra um perfil mais voltado para a auto-agressividade do que para a agressão ao sexo oposto). Também houve uma maior prevalência de depressão e de transtornos ansiosos. Apenas 8% apresentaram TOC. E, ao contrário do que se pensava, não existe uma correlação entre amor patológico e intensidade de amor (amor excessivo), mas sim a persistência num amor não que não dá certo e gera sofrimento.



-Quantidade de amor
A questão da quantidade de amor foi abordada pela psicoterapeuta de casais Robin Norwood no seu famoso best seller "Women who love too much", base do grupo de auto-ajuda Mulheres quem Amam Demais Anônimas. O livro relata a história de diversas mulheres atendidas na experiência clínica da psicoterapeuta que delineia o comportamento excessivo, progressivo de dar amor e atenção ao parceiro, o qual levaria a mulher a se tornar viciada e dependente de um homem distante e negligente.

Outro livro que coloca o amor patológico como uma dependência comportamental é “Love and Addiction”, de Stanton Peele. Ele definiu o conceito do amor como uma "experiência viciadora" que seria absorvida pela mente da pessoa, que assim como acontece com os analgésicos, aliviaria a sensação de ansiedade e dor.

BOX

-Homens que amam demais

O empresário S.E, 50 anos, chefe de família, tinha um relacionamento estável com sua mulher, quando embarcou numa acalorada paixão por uma garota de programa de 25 anos. Refém de uma paixão avassaladora, ele achou que poderia resgatá-la da prostituição. Começou a empenhar todos os recursos pessoais para atrair a atenção da amada. Ela recusou todas as investidas. Quanto mais ela o rejeitava, mais ele a desejava. Homem bem sucedido, ele perdeu tudo: trabalho, casa e família, por causa desse amor mal resolvido - o drama do empresário é um dos casos narrado pela escritora Tatiana Ades, em seu livro “Hades – Homens que Amam Demais”, lançado pela Editora Record. O nome do livro é uma referência ao mito de Hades, o sedutor deus grego, que detinha todos os encantamentos, até que se apaixonou por uma deusa que não o desejava. Ele, então, a sequestrou, provocando um grande caos na Terra, por causa de um amor não correspondido.

“O livro traz narrativas como a de Hades. A partir da mitologia grega, percebemos que desde épocas mais remotas já existiam histórias de homens que amavam demais, apesar de nossa sociedade não reconhecer a fragilidade que existe no universo masculino”, explica a autora. “Alguns homens têm a mulher que querem, mas quando não correspondidos, eles sofrem demais. São homens que se envolvem em relações destrutivas e problemáticas sem conseguir romper o círculo vicioso”, acrescenta.

Tatiana recolheu narrativas de dez homens paulistanos que sofrem de amor patológico. Ela percebeu que eles sofriam dos mesmos sintomas das mulheres que frequentavam a sociedade anônima MADA. “São pessoas que viveram em lares desajustados. Na maioria dos casos, o homem foi criado por uma mãe muito ausente ou tinha uma relação simbiótica com ela. O sujeito, então, reproduz a relação doentia com a figura materna”, analisa.

-As cores do amor
O primeiro grande estudo sobre amor foi feito pelo sociólogo John Alan Lee, da Universidade de Toronto, e publicado em “The Colors of Love”. Ele realizou 120 entrevistas em cidades canadenses e inglesas em que os participantes descreviam o amor, comprovando que haveria vários estilos de amor. Então ele colocou os vários estilos em rodas da cor e comparou o mecanismo humano da visão de cores com a capacidade de amor. Para Lee, assim como os olhos que só têm receptores para três cores, também temos três estilos primários.

Outra teoria que tenta explicar o amor patológico é a Teoria Triangular do Amor, formulada pelo psicólogo Robert Sternberg, da Universidade de Yale. Segundo essa teoria, o amor se desdobraria em três elementos: intimidade, paixão e decisão/compromisso. Ele identificou sete diferentes tipos de amor: amizade, paixão, amor vazio, amor romântico, amor companheiro, amor instintivo, amor verdadeiro.

Diagnóstico diferencial

Amor saudável
Erotomania
Ciúme patológico
Transtorno de personalidade borderline
Co-dependência
Transtorno obessivo-compulsivo

Critérios para diagnóstico de amor patológico:

1) Sinais e sintomas de abstinência - quando o parceiro está distante (física ou emocionalmente) ou perante ameaça de abandono, podem ocorrer: insônia, taquicardia, tensão muscular, alternando períodos de letargia e intensa atividade.

2) O ato de cuidar do parceiro ocorre em maior quantidade do que o indivíduo gostaria - o indivíduo costuma se queixar de manifestar atenção ao parceiro com maior freqüência ou período mais longo do que pretendia de início.

3) Atitudes para reduzir ou controlar o comportamento patológico são mal-sucedidas - em geral, já ocorreram tentativas frustradas de diminuir ou interromper a atenção despendida ao companheiro.

4) É despendido muito tempo para controlar as atividades do parceiro - a maior parte da energia e do tempo do indivíduo são gastos com atitudes e pensamentos para manter o parceiro sob controle.

5) Abandono de interesses e atividades antes valorizadas - como o indivíduo passa a viver em função dos interesses do parceiro, as atividades propiciadoras da realização pessoal e profissional são deixadas, como cuidado com filhos, atividades profissionais e convívio com colegas.

6) O amor patológico é mantido, apesar dos problemas pessoais e familiares - mesmo consciente dos danos resultantes desse comportamento para sua qualidade de vida, persiste a queixa de não conseguir controlar tal conduta.

Fonte: “Amor Patológico: Um Novo Transtorno Psiquiátrico”, de Eglacy Cristina Sophia, Hermano Tavares e Mônica Zilberman

Rejeição

Ser rejeitado por um grande amor é uma das experiências mais dolorosas da experiência humana. A antropóloga Helen Fisher, da Universidade Rutgers, nos Estados Unidos, e sua equipe descobriram, a partir de escaneamento do cérebro a partir de ressonância magnética funcional que há uma área do cérebro que fica mais ativa quando os voluntários (rejeitados por seus parceiros) observavam a imagem da pessoa amada, o núcleo accubens, relacionado à sensação de recompensa. Há ativação também de outras áreas ligadas ao pensamento obsessivo-compulsivo e raiva. 

Reportagem publicada na revista Psique

EMT regulariza funcionamento cerebral



Roberta de Medeiros

O Conselho Federal de Medicina aprovou o uso clínico terapia conhecida como estimulação magnética transcraniana (EMT), que usa pulsos magnéticos para regularizar o funcionamento cerebral de pessoas com transtorno mental. A técnica consiste na liberação de uma certa quantidade de energia na área do cérebro afetada pela doença. No paciente sentado ou deitado, são colocados eletrodos, envolvidos em esponjas com soro fisiológico na região frontal da cabeça. O seu uso clínico deve ser restrito ao tratamento de depressão, transtorno bipolar, alucinações auditivas, esquizofrenia e planejamento neuro-cirúrgico.
 
No Brasil, a terapia vem sendo empregada apenas em pesquisas. Países como Estados Unidos, Canadá, Japão, Nova Zelândia e Egito, além de praticamente toda União Européia, já haviam aderido ao recurso. Os estudos sobre a estimulação magnética começaram nos anos 90 e tudo indica que será cada vez mais empregada. Há pesquisas que sinalizam os efeitos benéficos da técnica no tratamento de Parkinson, distonia, esclerose, epilepsia, enxaqueca, membro fantasma, insônia, dislexia, esquizofrenia, transtorno bipolar, síndrome do pânico e transtorno obsessivo-compulsivo (TOC).
 
O método surge como alento para os pacientes com problemas neurológicos e psiquiátricos resistentes aos medicamentos. Além de ser uma maneira de evitar os efeitos colaterais dos remédios usados no tratamento dessas doenças. Os antidepressivos, por exemplo, podem causar disfunção erétil, ganho de peso, sonolência, náuseas e vômitos, diarreia e prisão de ventre. Estudos mostram que cerca da metade dos pacientes abandonam o tratamento em um ano devido aos efeitos colaterais. “Além disso, um em cada três pacientes continua deprimido mesmo depois de tomar adequadamente mais de quatro antidepressivos”, diz o psiquiatra André Russowsky Brunoni, do Hospital Universitário da USP.
 
O primeiro estudo brasileiro a mostrar que o método capaz de acelerar o tratamento contra depressão foi feito pelo Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas de São Paulo. A terapia é capaz de substituir a eletroconvulsoterapia (ECT), usada para ativar pontos do cérebro com a partir da corrente elétrica e indicada em casos de distúrbios mentais graves. A ECT, porém, causa efeitos indesejados, como dor, aumento da pressão arterial e da freqüência cardíaca.  Por isso, exige cuidados que poderiam ser dispensados com a estimulação magnética.

-Efeitos colaterais

Segundo o psiquiatra Marco Antônio Marcolin, coordenador do grupo de Estimulação Magnética Transcraniana, do Hospital das Clínicas da USP, a principal vantagem da estimulação magnética é que a terapia não apresenta efeitos colaterais. “Os pulsos magnéticos são aplicados sobre a cabeça do paciente atravessam o crânio sem causar dor. A técnica é indolor, não requer a aplicação de anestesia, não causa convulsão e melhora a memória”, diz.

O estudo envolveu 45 pacientes com depressão severa que cujos sintomas resistiram ao tratamento com remédio. Eles foram divididos em dois grupos: um recebeu sessões de estimulação magnética e o outro de ECT. Enquanto parte dos pacientes tomava antidepressivo, uma outra recebia placebo, uma espécie de remédio falso – porém, sem o conhecimento dos avaliadores. O resultado foi que todas as pessoas submetidas à estimulação magnética tiveram a ação do medicamento acelerada pela terapia. “O antidepressivo passou a surtir efeito logo na primeira semana de uso, enquanto o período normal de resposta do organismo seria de 3 a 8 semanas, em média”, explica Marcolin,

Os pulsos magnéticos foram aplicados em uma região do cérebro no lado esquerdo da cabeça, ao lado da testa e acima dos olhos, onde fica o dorso-lateral pré-frontal esquerdo. A região, do tamanho de uma moeda, está ligada ao raciocínio lógico e à memória de curto prazo. Estudos revelam que pessoas com depressão têm menor atividade nessa área. A terapia é aplicada com o uso de uma bobina pequena que recebe uma corrente elétrica alternada que é colocada sobre o crânio, na região do córtex. A mudança constante de orientação da corrente é capaz de gerar um campo magnético que atravessa alguns materiais, como a pele e os ossos. O tratamento é feito a partir de séries repetidas de estímulos em sessões que podem durar até 30 minutos.

-Vantagem

A vantagem da técnica é que os pulsos magnéticos podem ser focalizados em pequenas áreas do córtex, dependendo da geometria e da forma da bobina. Quando atingem o córtex motor, eles podem produzir uma resposta muscular. Mas a estimulação pode ser dirigida a várias regiões do córtex. Os resultados irão depender das funções envolvidas com a área escolhida, produzindo também reações cognitivas e emocionais. Exames de neuroimagem determinam qual ponto do cérebro precisa ser estimulado.

Para Marcolin, a estimulação magnética terá um importante papel no tratamento de dores crônicas, distúrbios de memória, e dependência de drogas. Há também indícios de que o método ofereça bons resultados no controle de alucinações auditivas, sintoma comum em esquizofrenia, e transtorno bipolar. “A terapia ainda pode ser usada no mapeamento do cérebro com o campo magnético para retirada de tumores”, acrescenta.

O psiquiatra brasileiro Moacyr Rosa, professor da Universidade de Columbia, nos Estados Unidos, lembra que a estimulação magnética não tem a intenção de provocar convulsões, como no ECT. “Habitualmente a estimulação magnética transcraniana não induz uma convulsão, isto é, o disparo repetido do próprio cérebro depois da estimulação inicial. Por isso, os pacientes recebem o tratamento acordados e sentados confortavelmente, sem nenhum incômodo”, afirma. Ele observa, porém, que existe um risco, a de convulsão acidental. Isso pode acontecer quando o paciente tem epilepsia ou faça uso de certos medicamentos.

-SUS
O Instituto de Psiquiatria da USP pretende pedir a inclusão da terapia entre os procedimentos pagos pelo Sistema Único de Saúde para tratamento gratuito de depressão. Seria uma alternativa para pacientes que teriam de desembolsar cerca de R$ 300,00 por cada uma das sessões em clínicas particulares. São necessárias 20 sessões para o tratamento da depressão.


-Décifit Cognitivo
Outro estudo da USP mostrou o benefício do tratamento para pacientes com déficit cognitivo. Foram estudados homens e mulheres com idade entre 60 e 74 anos e mais de quatro anos de escolaridade, que se queixavam de ter uma piora  da memória. Os participantes passaram por uma triagem para avaliação do estado cognitivo. Depois de 10 sessões de estimulação eles foram novamente avaliados por testes cognitivos.

Os problemas de memória podem estar associados a doenças degenerativas, embora isso não seja uma regra. Outras causas são a ansiedade e depressão, metamemória (pensamentos e crenças pessoais sobre a memória) e doenças neurológicas, como história de traumatismo craniano e acidente vascular cerebral. Outras condições que podem ocasionar déficit de memória é história de cirurgia cardíaca, desnutrição, déficit da atenção, efeitos colaterais de medicamentos  e deficiência de vitaminas do complexo B (tiamina, ácido fólico e vitamina B12).

A psiquiatra Hellen Marra, que coordena o estudo, diz que há um período de transição entre o envelhecimento normal e o diagnóstico de comprometimento cognitivo leve. Pessoas com comprometimentos leves da cognição podem progredir para quadros demenciais de forma mais rápida que as pessoas saudáveis. “É reconhecido que a maior proporção desses indivíduos continua estável ou mesmo reverte para a normalidade. É de grande importância a identificação desta ‘zona cinzenta’ em idosos, e se as queixas de memória indicam mudanças em relação ao desempenho prévio”, explica.

Hoje, há poucos recursos para o tratamento do déficit cognitivo. Embora não haja tratamento específico, é imprescindível o controle dos fatores de risco para doença cardiovascular, envolvendo o estilo de vida (atividade física e dieta) e uso adequados das medicações para controle de hipertensão, dislipidemia e diabetes.“As evidências de benefício com o uso de anti inflamatórios, vitaminas C e E, gingko biloba, selegilina são insuficientes”, alerta Hellen.

“Os resultados positivos estudo nos faz pensar na possibilidade de empregar a a terapia em outros distúrbios de memória, como em pacientes com Alzheimer. Há na literatura estudos preliminares apontando benefício, inclusive associando estimulação magnética ao treino cognitivo”, diz Hellen.

-Depressão em gestantes
O Instituto de Psiquiatria da USP também pretende avaliar a eficácia do tratamento em gestantes que sofrem de depressão. Serão selecionados dois grupos de 20 gestantes, um deles receberá placebo e o outro, estimulação por ondas magnéticas. Serão 20 sessões por um mês. Normalmente, as gestantes que sofrem de depressão são medicadas com antidepressivo, sedativos e estabilizadores de humor, dependendo do quadro.

Os especialistas, entretanto, alertam para a possibilidade da medicação causar problemas de malformação do feto. “É preciso avaliar o risco benefício do uso da medicação no caso de gestantes. Ainda são escassos os estudos que demonstrem que esses medicamentos causem prejuízo na formação do bebê,  quase não há estudos controlados nesse grupo”, observa diz a psiquiatra Renata Sciorilli Camacho, responsável pela pesquisa.

“A estimulação é eficaz, porque é bem localizada, dirige-se diretamente a uma região específica do cérebro e não prejudica o feto. Além disso, o feto não estaria sendo exposto aos riscos existentes no uso da medicação”, explica. Há uma melhora cognitiva, que normalmente está prejudicada nos pacientes que sofrem de depressão. “Eles geralmente têm o raciocínio mais lento”, diz a psiquiatra.

A gestão na gravidez é algo que preocupa especialistas. As gestantes podem ter cuidados precários durante o pré-natal, com prejuízo para gravidez, redução do peso do feto, além do abuso de drogas, álcool e tabagismo. A depressão atinge cerca de 13% das gestantes. Nos Estados Unidos, cerca de 500.000 gestações são complicadas anualmente devido ao quadro depressivo das mães.

Sintomas comuns são tristeza excessiva e às vezes sem causa aparente, desânimo, cansaço, falta de vontade para as atividades diárias, choro fácil, insônia, alterações do apetite. “As gestantes que apresentam estes sintomas devem procurar ajuda médica, pois além do prejuízo nos cuidados pessoais e pré-natais, apresentam uma chance maior de desenvolverem a depressão pós-parto”, alerta a psiquiatra.

-Dislexia

Tudo em indica que a terapia também apresente bons resultados em crianças com dislexia, um distúrbio neurobiológico de funcionamento do cérebro que afeta a leitura, a escrita e a soletração. É o que revela um estudo da USP em parceria com a Unicamp. Foram estudadas crianças de 7 a 12 anos. Elas tiveram o cérebro mapeado por exames de neuroimagem, que mostraram uma falha de ativação de uma determinada região do cérebro. “Em uma única sessão houve melhora no processamento de leitura e linguagem”, comemora Marcolin. Esta foi a primeira pesquisa do gênero feita no mundo. Seus resultados foram mostrados no Congresso de Paris em 2010. A próxima  etapa do estudo será ampliar o número de crianças estudadas.

-Efeitos adversos

O receio dos pesquisadores é que a estimulação possa causar algum prejuízo à função cognitiva. O uso de baterias neuropsicológicas nos estudos de estimulação magnética em pacientes com depressão, porém, tem fornecido dados valiosos quanto à segurança dessa técnica. Esses estudos mostram que essa terapia é segura e pode, inclusive, aumentar a performance cognitiva dos pacientes submetidos ao tratamento com estimulação.

Artigo publicado na revista Psique

sexta-feira, 7 de outubro de 2011

Gustavo Teixeira fala sobre bullying


Por Roberta de Medeiros
Publicado na revista Psique
O bullying fazia parte da vida de Wellington Menezes de Oliveira, 23, que invadiu a escola Tasso da Silveira, no Rio de Janeiro, matou 12 alunos e se suicidou. Um colega de sua turma contou que ele falava sozinho, era humilhado por outros estudantes e permanecia sozinho no recreio. Ele era chamado de “suingue”, por andar mancando de uma perna. Os estudantes o apelidaram de Sherman, um nerd, personagem do filme “American Pie”. Meninas encarnavam muito nele. Passavam a mão e o chamavam de veadinho. Garotos amarravam o cadarço dele à mesa e um dia o jogaram na lixeira", lembra Rodrigo França um dos colegas de Wellington.
Alguns especialistas ventilam a hipótese do atirador possuir algum tipo transtorno mental, talvez desencadeado pelo estresse sofrido pelo bullying. A tragédia suscita a idéia de que algo precisa ser feito para mudar esse ambiente de violência na escola. Uma pesquisa realizada pela Pan Brasil em 2008 mostrou que 70% dos alunos de escolas brasileiras pesquisadas alegam terem sido vítimas de violência na escola, sendo que 84% consideraram a sua escola violenta. Os pesquisadores entrevistaram 12 mil estudantes.

Outro levantamento realizado pela Associação Brasileira Multidisciplinar de Proteção à Infância e à Adolescência em 2002 envolvendo quase seis mil alunos do sexto ao nono do ensino fundamental de 11 escolas do Rio de Janeiro, mostrou que 40,5% dos estudantes admitiram ter algum envolvimento com o bullying, sendo 16,9% como vítimas, 12,7% como agressores e 10,9% afirmaram serem vítimas e também agressores.

Pesquisas mostram que as vítimas de agressões na escola podem desenvolver depressão e transtornos de ansiedade, o que pode culminar em suicídio. E aqueles que praticam violência contra os colegas na escola podem apresentar transtornos de conduta na adolescência. Quem comenta essas questões é o psiquiatra Gustavo Teixeira, professor da Bridgewater Station University, em Massachusetts, Estados Unidos, e autor do “Manual Antibullying”, que acaba de ser publicado pela editora Best Seller.

Teixeira cursou Medicina nos Estados Unidos, onde aprendeu sobre programas escolares de inclusão de crianças com necessidades especiais. Especializou-se em Dependência Química na UFRJ e em Saúde Mental Infantil na Santa Casa do Rio de Janeiro. Pesquisador do comportamento infantil, ele tem se dedicado cada vez mais à aplicação de cursos para professores.

Psique- O fato de ter sido vítima de bullying explica a conduta de Wellington Menezes de Oliveira , que matou 12 alunos de uma escola do Rio de Janeiro?

O bullying isolado não é causa desse tipo de comportamento. Mas as agressões sofridas na escola podem ser o gatilho que desencadeou outras doenças psiquiátricas. No caso de Wellington, o bullying estava associado à esquizofrenia. Seus delírios estavam relacionados à temática escolar. Tudo indica que ele estava magoado com a escola, provavelmente não recebeu a ajuda que precisava.


Psique- O bullying está sempre relacionado com uma tentativa de estabelecer uma relação de poder em relação aos demais?

Gustavo- É importante lembrar que, por definição, o bullying se caracteriza pelo comportamento agressivo no ambiente escolar e acadêmico e essa relação de poder diante dos demais sempre está presente. Essa violência é sempre repetitiva e provoca sofrimento. São atos de agressão física, verbal, moral ou psicológica. No caso do bullying, assistimos uma relação desigual de poder em que um ou mais alunos tentam dominar e humilhar os demais. Vemos que crianças agressivas têm uma maior capacidade de manipular outras crianças, enquanto as vítimas são crianças que não conseguem pedir ajuda.


Psique- Quando alvo de bullying, meninos e meninas são afetados de formas diferentes?

Sim, normalmente os meninos são mais agressivos e partem para agressão física, enquanto o bullying nas meninas pode ser mais escondido, através de isolamento, exclusão, difamação.

Psique- Qual o perfil psicológico dos agressores e das vítimas?

Gustavo- Os agressores são crianças mais habilidosas na comunicação, têm facilidade de mobilizar outras crianças. Eles têm uma agressividade exacerbada, são fisicamente mais fortes, são muito autoconfiantes e podem até ser populares entre os colegas. Eles costumam confrontar pais e professores, são mais falantes e mais extrovertidos. O agredido tem poucos amigos, geralmente são tímidos, retraídos e mais fracos fisicamente. Eles podem apresentar rendimento ruim na escola, são solitários e passam o recreio sozinhos. Esses alunos têm um prejuízo muito grande auto-estima, eles não conseguem pedir ajuda, por medo ou por acreditar na impunidade, o que faz com que o problema continue. Essa postura passiva das vítimas, que respondem as agressões com choro, é visto como um sinal de que elas são alvos fáceis pelos agressores. Mas é certo que há exceções. Eu atendi um caso de uma criança que era vítima de bullying porque era a melhor aluna da sua turma, mas ela tinha uma dificuldade de comunicação que a impedia de pedir ajuda.

Psique- Quais os transtornos mentais desencadeados nas vítimas do bullying? O bullying pode trazer problemas psiquiátricos na adolescência?

Gustavo- O bullying pode funcionar como desencadeador de estresse e causar prejuízo da autoestima. As agressões sofridas na escola funcionam como um gatilho que desencadeia quadros psiquiátricos como a depressão e o transtorno de ansiedade em crianças que já têm predisposição genética para desenvolver esses distúrbios. É muito comum que essas crianças desenvolvam fobia escolar. Elas passam a ter um comportamento evitativo, apresentando queixas físicas antes que ir para escola, como dor de cabeça, dor de estômago, enjoo. Em casos extremos, o quadro pode culminar no suicídio.


Psique- Os agressores, quando impunes, têm maior risco de apresentar transtornos mais tarde?

Sim, estudos indicam que muitos agressores apresentam transtorno de conduta na adolescência. Esses estudantes apresentam mais chances de fazer uso abusivo de álcool e drogas, maior envolvimento em brigas e com o crime, podem andar armados, apresentar problemas com a justiça e atitudes delinqüentes.

Psique- O Sr. menciona que crianças que são ao mesmo tempo vítimas e agressores têm maior risco psicopatológico...

Gustavo- O bullying envolve vários personagens. Existem as crianças que são agressoras, as vítimas e as testemunhas, como há também aquelas que são ao mesmo tempo agressoras e vítimas. Geralmente são crianças mais impulsivas, o que nós chamamos de vítimas provocadoras. Elas irritam outros alunos, o que desperta a agressão de outras crianças. São agressivas tentam se vingar daqueles que as ataca.

Psique- O Sr diz que violência gera violência. Ou seja, crianças que são vítimas de humilhações e violência em casa tendem a repetir esse comportamento na escola...

Gustavo- Quando a criança é vítima de agressão em casa, ela pode aprender que o comportamento agressivo é normal. O pai, por exemplo, pode pedir à criança para bater nos demais, como se isso fosse natural. Crianças que vivem em lares pouco harmoniosos, marcados pela violência e com pouco diálogo têm maiores chances de desenvolvem um comportamento agressivo. A permissividade dos pais também pode gerar crianças desafiadoras, com comportamento agressivo na escola. A violência em casa pode favorecer o bullying, tanto no caso dos agressores, quanto no caso das vítimas, que são maltratadas pelos pais e que chegam à escola com a auto-estima muito prejudicada, o que a torna um alvo fácil em relação aos demais. 


Psique- O temperamento da criança opositiva e desafiadora também pode ter um componente genético, não é?

Gustavo- Tudo relacionado a nosso comportamento é genético. Um temperamento mais impulsivo e agressivo, o que predispõe a criança a ter um comportamento hostil no ambiente escolar. Já as crianças mais calmas e menos impulsivas estão mais predispostas a figurar como vítimas. 

Psique- O risco de tentativa de suicídio entre as vítimas é significativamente maior?

Gustavo- A literatura mostra que, muitas vezes, há uma questão psicopatológica envolvida nas tentativas de suicídio, como a depressão, que funciona como um gatilho para os pensamentos de morte a ideação suicida. As crianças alvos de bullying podem ainda apresentar insônia, baixa auto-estima e desenvolver transtornos de ansiedade. São crianças com níveis de estresse muito altos, o que prejudica seu rendimento na escola.

Psique- Qual o maior obstáculo para estimular a cultura pacifista na escola?

Gustavo- O maior desafio é conscientizar pais e educadores sobre o bullying, de modo que eles possam estimular nas crianças valores éticos, o respeito às diferenças. E mostrar a esses agentes o quanto é importante combater o bullying.


Psique- É válido ensinar esportes de luta para que a criança alvo de agressão possa se defender?

Gustavo- Sim. Esportes coletivos podem ajudar na socialização das crianças mais retraídas, estimulando valores como o respeito à hierarquia, à moral e à ética, além de melhorar a auto-estima. O objetivo dos esportes de luta não é tornar o aluno apto à briga, mas desenvolver a autoconfiança, lembrando que o agressor procura crianças inseguras. Noto que os professores de educação física são habilidosos quando se tem em mente incluir crianças como dificuldades de comunicação.

Psique - É comum os pais aumentarem o isolamento dos filhos na tentativa de protegê-los das agressões...Essa superproteção é prejudicial?

Gustavo- É importante que os pais tenham em mente que essas crianças vítimas de bullying têm uma dificuldade de interação social. Tanto os pais quanto professores devem, ao contrário, estimular a socialização. Isolar na tentativa de proteger pode ser até pior, estimulando o bullying.

Psique- Como foi sua experiência no trabalho com adolescentes em escolas fora do país?
Trabalho há dez anos com saúde mental na infância e ofereço palestras sobre bullying. Notei que o tema despertava muito interesse entre os educadores, que não sabiam como proceder em relação a esse problema. Daí surgiu o meu projeto, o Manual Antibullying, com a proposta de oferecer um suporte tanto para pais, quanto para educadores. No exterior, há um grande interesse dos pesquisadores em relação ao bullying. Há programas nas escolas para conscientizar pais e educadores sobre os impactos negativos do bullying.

Conseqüências do bullying para as vítimas

-Desinteresse pelos estudos
-Prejuízo acadêmico
-Reprovação escolar
-Mudanças sucessivas de escolas
-Abandono escolar
-Estresse
-Insegurança
-Medo
-Problemas de auto-estima
-Isolamento social
-Insônia
-Ansiedade
-Fobia escolar
-Depressão
-Suicídio

Conseqüência para os agressores

-Uso abusivo de álcool e outras drogas
-Maior envolvimento em brigas corporais
-Criminalidade
-Posso de armas
-Problemas com justiça
-Atos delinqüentes
-Furtos
-Agressões
-Destruição do patrimônio público
-Repetição do comportamento na faculdade e no trabalho


O que os pais podem fazer:

-Conversar com o filho sobre bullying
-Mostrar a importância do respeito mútuo e de saber tolerar as diferenças de cada um
-Dizer que a violência deve ser evitada
-Tentar identificar as razões para o comportamento agressivo
-Procurar a escola e conversar com professores sobre o problema


Tipos de agressões:

-Física: bater, chutar, empurrar, derrubar, ferir, perseguir.
-Verbal: xingar, ameaçar, intimidar, gritar.
-Moral: amedrontar, apelidar, discriminar, humilhar, intimidar, dominar, tiranizar, excluir, assediar e perseguir.
-Sexual: assediar, insinuar, abusar e violentar.


Como identificar se um aluno está sendo alvo de bullying

-Conquista poucos amigos
-Passa tempo do recreio sozinho
-Chega em casa chorando sem explicar o motivo
-Tem medo de ir à escola
-Chega em casa com o material destruído
-É xingado, ridicularizado ou recebe apelidos pejorativos na escola
-Tem machucados, arranhões, roupas rasgadas, manchadas de giz ou caneta
-É agredido fisicamente, mas não é capaz de se defender
-Está envolvido em brigas levando sempre a pior
-É excluído das brincadeiras
-Apresenta uma queda no rendimento escolar
-Parece estar sempre infeliz e desmotivado para escola
-Fica inseguro nos momentos que antecedem sua ida à escola
-Prefere a companhia dos adultos no recreio
-Mostra-se inseguro e ansioso na sala de aula
-Nunca apresentou nenhum amigo aos pais
-Nunca vai à casa dos colegas de escola
-Dorme mal e tem pesadelos com temática escolar


sexta-feira, 26 de agosto de 2011

Batalha contra o espelho

Por Roberta de Medeiros

As cirurgias plásticas viraram uma obsessão do cantor americano Michael Jackson. As intervenções começaram em 84 e não pararam mais. Em uma entrevista concedida em 1993 à apresentadora americana Oprah Winfrey, o astro pop descreveu sua personalidade como perfeccionista e "nunca satisfeito com nada", incluindo sua aparência.  Jackson não está sozinho. Afinal, quem nunca se sentiu insatisfeito diante do espelho ao menos por um dia? Mas há quem confira dimensões extremas à conhecida fábula do patinho feio e transforme o próprio corpo num verdadeiro campo de batalha. São pessoas que sofrem de uma desordem psicológica chamada dismorfofobia ou transtorno dismórfico, que faz com que elas alimentem idéias irreais sobre a própria imagem corporal.
 
É o caso da engenheira química C., de 39 anos, que teve sérios problemas devido à excessiva preocupação com sua aparência física. Dizia que seu rosto se tornava flácido e que suas bochechas estavam prestes a desabar. Começou a se sentir insegura a ponto de não sair na rua sozinha. Deixou de dirigir, ficando a maior parte do tempo em casa. Passou a ter espasmos no rosto e deixou até mesmo de falar. Exames clínicos, porém, não mostraram qualquer alteração na pele ou no tônus muscular do rosto de C., mulher jovem e de boa aparência. Ainda assim ela persistia em suas queixas quanto à face.
O distúrbio foi relatado pela primeira vez pelo psiquiatra italiano Enrico Morselli, em 1886. À época, foi descrito como um sentimento de feiúra ou defeito no qual a pessoa sente que é observada por outras, embora sua aparência esteja dentro dos limites da normalidade. Por isso, o distúrbio recebeu o nome de “hipocondria da beleza”. Somente nos Estados Unidos o distúrbio atingiria cerca de 5 milhões de pessoas ou 2% da população. “Trata-se de uma certeza, muitas vezes delirante, de que uma parte do corpo não está OK. Enquanto a pessoa que alucina, inventa  o mundo, o delirante vê o mundo com outros olhos”, compara o neurologista Edson Amâncio, autor do livro “O Homem que Fazia Chover”, da editora Barcarola.
“Em geral, as queixas envolvem falhas imaginárias ou leves no rosto ou na cabeça, como acne, cicatrizes, rugas ou inchaço”, diz. Dificuldades sociais e conjugais ocorrem com as pessoas que têm o transtorno, dependendo do grau de gravidade, a ponto de terem sua vida completamente desestruturada. “O prejuízo pode ser resultado do tempo que se gasta com a atenção ao corpo, em detrimento de outros aspectos da vida, quase sempre negligenciados”,  diz Amâncio. “Quem sofre da doença se olha com freqüência no espelho ou em outras superfícies refletoras para checar a aparência, o que pode consumir muitas horas por dia numa atitude compulsiva bastante difícil de resistir”, diz o neurologista. Outros, ao contrário, esquivam-se de espelhos em uma tentativa não bem sucedida de diminuir o mal estar e a preocupação.
- Camuflagem
As queixas de quem tem preocupação exagerada com o corpo, entretanto, são vagas. Muitas pessoas evitam descrever seus defeitos em detalhes, podendo se referir à sua "feiúra" em geral. Essas pessoas tentam camuflar seus defeitos imaginários com óculos escuros, bonés, luvas ou roupas. O psiquiatra e psicoteraupeuta Geraldo Possendoro, professor da Unifesp, lembra que a crença de que algo está errado com o corpo pode extrapolar todos os limites. “A pessoa pode se queixar que os poros do nariz estão muito abertos, por exemplo. Muitas vezes não há defeito algum ou defeito é supervalorizado pelo paciente”, diz Possendoro, para quem o problema muitas vezes está associado à baixa auto-estima.
Os indivíduos com esse transtorno freqüentemente pensam que os outros estão observando o seu "defeito", o que pode levar a uma esquiva das situações sociais que, levada ao extremo, chega até ao isolamento social. “Esses pacientes com freqüência buscam e recebem tratamentos para a correção de seus defeitos imaginários, em uma peregrinação por diversos profissionais, principalmente cirurgiões plásticos, sem, no entanto, corrigir os supostos defeitos”, diz Possendoro.
Alguns especialistas chegam a questionar se a anorexia poderia ser um caso de dismorfofobia, já que os indivíduos supervalorizam o seu tamanho do seu corpo e se angustiam com seu defeito imaginado. Já Possendoro defende que o diagnóstico diferencial entre anorexia do transtorno dismórfico. “Na anorexia o paciente tem um daltonismo para o próprio corpo, ela se olha no espelho e se acha muito gorda. O aspecto mais importante do tratamento é fazer com que ela adquira a crença de que ela é daltônica de que ela não pode confiar na imagem que ela faz do próprio corpo”, explica. Ele lembra que o transtorno também não pode ser confundido com transexualismo, no qual a pessoa tem corpo de homem, mas sente-se uma mulher.
O tratamento inclui antidepressivos e psicoterapia. A literatura, no entanto, aponta a possibilidade do transtorno seja, na verdade, um delírio somático, isto uma crença irreal (e incorrigível pela argumentação) sobre o próprio corpo. “Nesse caso, o tratamento incluiria a administração de antipsicóticos associados a antidepressivos”, diz Possendoro. 
 “Quanto à história familiar, não existem dados que estabeleçam um padrão familiar claro do transtorno dismórfico corporal com outros transtornos psiquiátricos”, diz Amâncio.
-Narcisismo
Para a psiquiatra Magda Vaissman, professora da UFRJ, transtornos de personalidade como narcisista, obsessivo-compulsivo e borderline podem predispor à dismorfofobia. “É muito frequente que o transtorno esteja associado ao narcisismo. São pessoas que estão mais preocupadas consigo do que com o outro, como o mito de Narciso, que se apaixonou pela própria imagem. Do ponto de vista psicanalítico, é um problema na elaboração do narcisismo primário. No complexo de Édipo, a criança sai do narcisismo parar ir ao encontro do outro. Mas isso pode não ser bem elaborado, dando origem à personalidade narcisista”, explica.
Em outros casos, a dismorfofobia está relacionada ao transtorno obsessivo compulsivo, no qual a pessoa se entrega a uma série de rituais de verificação do corpo marcas e cicatrizes para afastar um pensamento incômodo ou intrusivo. A diferença do paciente com TOC e relação àquele que sofre de dismorfofobia é que no primeiro caso ele está de convencido de que o pensamento intrusivo que leva à compulsão não é verdadeiro, embora não consiga se libertar, enquanto no segundo caso, a preocupação com o corpo é quase um delírio.  “O quadro pode se apresentar como uma compulsão, no qual a pessoa segue uma série de rituais ou pode ocorrer ao nível do pensamento, que são as obsessões”, analisa.
Ela lembra que a vigorexia, uma espécie de dependência por exercícios físicos associada ao culto à imagem, pode ser uma variante da dismorfofobia. “A pessoa nunca está satisfeita com o corpo, acha que pode perder massa muscular, mergulha numa rotina extenuante de exercícios e muitas vezes recorre aos anabolizantes para manter o tônus muscular”, diz Magda.
-Cultura do belo
Uma entrevista feita com 162 homens e 184 mulheres feita pela divisão de psicologia do Hospital das Clínicas em São Paulo mostrou que 69% dos entrevistados passaram pelo menos uma hora por dia pensando que não têm uma boa imagem. Mas o que leva cada vez mais pessoas a um descontentamento tão grande com a própria imagem?
O transtorno pode ser reflexo de uma sociedade obsessivamente preocupada pela estética corporal, que vende corpos em outdoors. Essa mensagem é amplificada pelos meios de comunicação. “A nossa sociedade finge que transtorno não é um problema. Há um individualismo exacerbado, as pessoas vivem isoladas, as famílias são desestruturadas...A cultura do belo incentiva a competição, o indivíduo vive mergulhado numa sensação de fracasso, ele sente de que nunca vai chegar lá”,  afirma Magda.
 “O problema é que a maioria das pessoas com dismorfofobia não procura atendimento psiquiátrico, já que a sociedade incentiva a cultura do belo”, analisa Magda. Outro motivo que afasta dismórficos dos consultórios é que muitos preferem se entregar ao bisturi. Pesquisa feita pelo Instituto InterScience, revelou que 90% das mulheres e 65% dos homens afirmam sonhar com mudanças no próprio corpo. Do total, 5% já tinham feito alguma plástica e 90% já faziam planos de realizar a segunda. Entre aqueles que nunca fizeram uma cirurgia plástica, 30% declararam que esperavam ter coragem para realizá-la.

Um estudo feito pelo Observatoire Cidil des Habitudes Alimentaires (Ocha) em um universo de mil mulheres revelou que 86% delas se dizem insatisfeitas com suas medidas. Apenas 14% alegaram estar satisfeitas com o próprio corpo. O Brasil é o segundo no ranking dos países que mais realizam cirurgias plásticas, metade delas puramente estéticas – 40% lipoaspiração, 30% mamas, 20% face. A maioria foi realizada em pessoas de 20 a 34 anos. O número de jovens que colocaram próteses para "turbinar" os seios aumentou 300% nos últimos dez anos.

E não adianta o familiar contrariar o paciente que sofre do transtorno. “Quando mais oposição se faz, mas se cria uma resistência por parte do paciente. O ideal é não incentiva-lo. O que a família pode fazer é mostrar que há outros prazeres na vida, que não o culto ao corpo, e fazê-lo entender que ele sofre de uma doença”, aconselha Magda.
Essas pessoas podem apresentar fortes ideações suicidas. 13% dos pacientes psiquiatricos britânicos apresentam o transtorno. 75% das pessoas com dismorfofobia não se casam ou se divorciam, 70% tem ideações suicidas e 25% realmente se suicidam. 20,7% das pessoas que fazem cirurgias de rinoplastia tem um possível diagnóstico de dismorfofobia. Pesquisa feita pela Universidade de Utrech, na Holanda, mostra as mulheres que se submetem operações de implante mamário apresentam risco três vezes maior de cometer suicídio em relação às demais mulheres. 82,6/% das pessoas que sofrem o transtorno se sentem insatisfeitas com os resultados das cirurgias. Existe a crença de que a próxima intervenção será a última. E assim, entram num circuito no qual a insatisfação é cada vez maior. Muitos casos vão parar na Justiça.
O problema nos faz questionar sobre a ética no exercício do cirurgião plástico. “O cirurgião plástico deveria estar preparado para identificar a dismorfofobia. O ideal seria uma interação entre o cirurgião e o psiquiatra ou o psicoterapeuta. Muitas vezes o profissional faz a correção daquilo que é um grande incômodo para o paciente, e esse desconforto em relação à aparência se desloca para outra região do corpo”, observa Amâncio.

Transtornos obsessivos


Pacientes com transtornos obsessivos têm uma maior atividade em uma determinada região do cérebro, o córtex pré-frontal, o que os leva a ter a procedimentos de controle exagerados, como retornar a própria casa várias vezes para checar se o fogão ou o ferro de passar foram desligados. Ou seja, estão sempre em estado de alerta. Dos transtornos psiquiátricos, o que mais se assemelha em critérios diagnósticos com a fobia social é o transtorno dismórfico corporal. Em ambos, os pacientes apresentam ansiedade social elevada, esquiva de situações sociais e medo de crítica e comentários adversos sobre sua aparência. Isolamento social e falta de habilidade social geralmente estão presentes nos dois casos.

Heródutus

Transtorno dismórfico corporal é um novo nome para um velho transtorno. Ele 0tem sido descrito nas literaturas européia e japonesa por uma variedade de nomes. A primeira referência aparece na história de Herodutus, no mito da garota feia de Esparta, que era levada por sua enfermeira, todos os dias, ao templo para se livrar da sua falta de beleza e atrativos.
Neurose compulsiva

Emil Kraepelin (1856-1926), grande psiquiatra alemão, considerado o criados da moderna Psiquiatria devido às suas enormes contribuições científicas contidas ao longo das oito edições de seu Tratado de Psiquiatria, ocupou-se do tema dismorfofobia, introduzindo-o na oitava edição do “Tratado sob a Rubrica de Neurose Compulsiva”. Considerou a dismorfofobia como uma das formas clínicas da série de medos obsessivos que surgem do contato com outras pessoas. É desta forma que a dismorfofobia assemelha-se à timidez, ao medo de provas e à antropofobia, entre outros.

Homem dos Lobos
Entre os cacos clínicos publicados por Freud, o do paciente Serguéi Constantinovitch Pankejeff ficou conhecido como o “Homem dos Lobos”. Ele iniciou sua análise com Freud em 1910 e apresentava, entre outros sintomas, uma preocupação excessiva com a aparência de seu nariz. Antes de iniciar a análise com Freud, já havia feito vários tratamentos e se consultando também com os médicos Theodor Ziehen, de Berlim, e Emil Krapelein, de Munique. Esse histórico, com certeza, aumentou o interesse de Freud pelo caso, pois considerava esses dois importantes médicos como “rivais” de profissão.

Tipos de delírio
Alguns autores defendem que a dismorfofobia pode se apresentar como um tipo de delírio que se caracteriza pela presença de uma imagem distorcida em relação ao corpo. Conheça os tipos de delírio:
Delírio erotomaníaco
A pessoa acredita ser amada por uma pessoa que ocupada posição superior, como autoridades e artistas.
Delirio de grandeza
A pessoa está convencida de que tem ligação com personalidades importantes ou que tem um talento especial ou possui grande fortuna.
Delírio de ciúme
Sem motivo justo, a pessoa acredita que está sendo traída. Ela toma medidas extremas, às vezes tiranas, na tentativa de controlar o parceiro.
Delirio persecutório
É o tipo mais comum entre os paranóicos ou delirantes crônicos. O delírio costuma envolver a crença de estar sendo vítima de conspiração, traição, espionagem, perseguição.
Delírio somático
São formas de delírio em relação ao corpo.  Os mais comuns dizem respeito à convicção de que a pessoa tem deformações de certas partes do corpo.

Os outros transtornos somatoformes são:

O transtorno de somatização (historicamente chamado de histeria ou síndrome de Briquet) é um transtorno polissintomático que inicia antes dos 30 anos, estende-se por um período de anos e é caracterizado por uma combinação de dor, sintomas gastrintestinais, sexuais e pseudoneurológicos.
O transtorno somatoforme indiferenciado que caracteriza-se por queixas físicas inexplicáveis, com duração mínima de 6 meses, abaixo do limiar para um diagnóstico de transtorno de somatização.
O transtorno conversivo envolve sintomas ou déficits inexplicáveis que afetam a função motora ou sensorial voluntária, sugerindo uma condição neurológica ou outra condição médica geral. Presume-se uma associação de fatores psicológicos com os sintomas e déficits.
O transtorno doloroso caracteriza-se por dor como foco predominante de atenção clínica. Além disso, presume-se que fatores psicológicos têm um importante papel em seu início, gravidade, exacerbação ou manutenção.
A hipocondria é preocupação com o medo ou a idéia de ter uma doença grave, com base em uma interpretação errônea de sintomas ou funções corporais.
O transtorno dismórfico corporal é a preocupação com um defeito imaginado ou exagerado na aparência física.
O transtorno de somatização sem outra especificação é incluído para a codificação de transtornos com sintomas somatoformes que não satisfazem os critérios para qualquer um dos Transtornos Somatoformes.
Fonte: Psiqweb /G J Ballone
Critérios Diagnósticos Transtorno Dismórfico Corporal
A. Preocupação com um imaginado defeito na aparência. Se uma ligeira anomalia física está presente, a preocupação do indivíduo é acentuadamente excessiva.
B. A preocupação causa sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social ou ocupacional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo.
C. A preocupação não é melhor explicada por outro transtorno mental (por exemplo, a insatisfação com a forma e o tamanho do corpo na anorexia).